A TERRA E A EXISTENCIA PODEM SER UM SONHO HOLOGRAFICO OU PROJEÇÃO
O
mundo é uma Matrix
Teologia, inteligência
artificial, filosofia, ciência futurista. E mais: efeitos especiais inéditos,
legiões de fãs extasiados e uma mistura intoxicante de cinema e videogame.
Mergulhe na alma de um dos filmes mais bem-sucedidos da história e saiba por
que os cientistas acham que ele é muito mais do que uma obra de ficção. Olhe à sua volta.
Perceba os detalhes da sua cadeira, do lugar em que você está, da textura das
suas roupas, do barulho ao fundo. Parecem reais? Eles não poderiam ser, por
exemplo, uma simulação feita por um enorme sistema de inteligência artificial?
Você pode achar que não, porque eles sempre estiveram ali e ao contrário dos
computadores, cadeiras nunca travaram de uma hora para outra. Mas pense novamente.
Existem muitas pessoas, muito inteligentes, que acham que isso pode ser
verdade. Para elas, o mundo talvez não seja como imaginamos. Há até quem
acredite que temos 25% de chances de viver mesmo em uma simulação de
computador. Ou seja, talvez a trilogia iniciada em 1999 com o filme Matrix não
seja tão despropositada quanto parece.
O debate vem em boa
hora. Estréia no dia 23 deste mês o filme Matrix Reloaded, a esperada
continuação do filme que descreve um futuro em que as máquinas mantêm a
humanidade presa a uma enorme simulação da nossa realidade, a Matrix.
O terceiro filme,
Matrix Revolutions, chega seis meses depois, em novembro. A estratégia dos
produtores é a mesma dos robôs que criaram a simulação preencher todos os
sentidos das pessoas até que elas não consigam mais sair do mundo que eles
inventaram. Junto com Reloaded, chega às lojas o videogame Enter the Matrix,
que é também uma continuação da história. Pela primeira vez o jogo e o filme
foram feitos juntos, como se fossem uma coisa só. Os atores, diretores,
produtores, coreógrafos e cenários do videogame são os mesmos de Matrix
Reloaded em um dia eles filmavam as cenas do cinema e no seguinte, as do
jogo. O resultado é que quem se aventurar no joystick não só verá uma hora a
mais de história como entenderá melhor algumas das passagens do filme. Rosana
Sun, uma das produtoras do jogo, explicou ao jornal americano USA Today como
será essa interação. Em Reloaded, por exemplo, há uma cena em que os
personagens discutem um plano para colocar bomba em um prédio de segurança.
O videogame traz a
continuação da conversa e coloca o jogador para comandar os personagens durante
a missão. Para distrair a espera entre os dois filmes, será lançado, em 3 de
junho, Animatrix, um vídeo e DVD com nove animações em estilo japonês, os
animes, inspiradas nos filmes. Quatro delas estão disponíveis de graça na
internet, no endereço http://www.theanimatrix.com.br.
A idéia é repetir o
sucesso do primeiro filme, que ganhou quatro Oscars, arrecadou 460 milhões de
dólares no mundo todo e foi o primeiro DVD a vender mais de 1 milhão de cópias.
Mais do que isso, as seqüências de ação em câmera lenta, as lutas
coreografadas, as roupas e os temas cyberpunk serviram de inspiração para
dezenas de filmes, videogames e propagandas que surgiram depois. Poucas coisas
em Hollywood foram tão plagiadas quanto o efeito tempo de bala o
impressionante truque em que a câmara gira 360 graus ao redor de uma cena. Matrix
conseguiu misturar estilo e substância de uma maneira que outros filmes não
foram capazes, afirma o filósofo Christopher Grau, da Universidade da Flórida,
organizador de uma seção do site oficial do filme chamada A Filosofia de
Matrix. Espera um pouco… filosofia? É, o filme levanta um número
surpreendente de questões filosóficas. Elas dão peso e substância ao que, de
outro modo, seria apenas um filme cheio de estilo, diz Grau.
Para as poucas almas
que não viram Matrix, ele conta a história do hacker Thomas (Keanu Reeves),
também chamado de Neo, que encontra um cara cheio de truques chamado Morpheus
(Laurence Fishburne). Ele toma uma pílula vermelha e descobre então que todo o
nosso mundo é uma realidade simulada por computadores, um enorme mundo virtual
chamado Matrix. A verdadeira realidade é um futuro em que as máquinas tomaram
conta do mundo e mantêm os humanos em pequenas cápsulas, onde sua energia é
usada para abastecer um gigantesco sistema de inteligência artificial enquanto
a mente deles é mantida em uma espécie de sonho que chamamos de realidade.
Morpheus é o líder de um grupo de rebeldes que quer nos libertar das máquinas e
acredita que Neo é o esperado salvador da humanidade, algo como um novo
messias. Depois de muito treinamento, golpes de kung-fu, roupas sombrias e
armas pesadíssimas, Neo consegue transcender a realidade de Matrix, desafiar as
leis da física e ganhar poderes sobre-humanos.
O enredo não traz só
questões filosóficas. O filme é uma salada de vários tipos de arte , feita
pelos enigmáticos irmãos Larry e Andy Wachowski, responsáveis pelo roteiro e
direção do filme. Entre as poucas informações que circulam a respeito deles
está a de que devoram todo tipo de livro, de tratados filosóficos a histórias
em quadrinhos. Talvez por isso, o filme tem ligações com muitas tecnologias e
previsões feitas hoje pelos cientistas, além de citações a várias obras
literárias. Os pequenos detalhes escondidos nas cenas do filme foram um dos
principais fatores que levaram o DVD a bater recordes os fãs assistiam
dezenas de vezes para perceber, por exemplo, que os objetos são
predominantemente verdes no mundo da simulação e azuis na realidade. No
entanto, a área de onde os diretores mais tiraram citações, nomes e referências
foi o campo das religiões.
Os humanos eram ignorantes do que não podiam ver. Havia muitas ilusões,
como se eles estivessem mergulhados no sono e se encontrassem em pesadelos.
Eles estavam fugindo, perseguindo outros, envolvidos em ataques, caindo de
lugares altos ou voando mesmo sem ter asas. Quando acordam, eles não vêem nada.
Ao deixar a ignorância de lado, não estimam suas obras como coisas sólidas, mas
as deixam para trás como um sonho. Essas palavras poderiam muito bem ser ditas
por Morpheus em um de seus discursos a Neo, mas na verdade são trechos do
Evangelho da Verdade, um manuscrito do século 4 encontrado em 1945 em um jarro
enterrado no Egito. Ele faz parte de um conjunto de manuscritos chamado Nag
Hammadi, que descreve a crença dos gnósticos, um grupo de cristãos que viveu
entre os séculos 2 e 5 e possuía suas próprias escrituras, crenças e rituais. É
a corrente cristã que mais se assemelha à Matrix.
Eles acreditavam que
nós iríamos acordar do mundo material e perceber que essa não era a realidade
verdadeira, afirma a professora de história da religião Frances Flannery Dailey,
do Hendrix College, nos Estados Unidos.
Não são poucas as
referências que o filme faz ao cristianismo. Neo é tido como um messias e
ressuscita no final do filme. Ele é amigo de Apoc (apocalipse) e Trinity (trindade
em inglês). A última cidade humana, Zion, é uma referência a Sião, a antiga
terra dos judeus, e a nave de Morpheus, Nabucodonosor, tem o nome do rei
babilônico que aparece na Bíblia com um sonho enigmático que precisa ser
decifrado.
Nenhuma religião, no
entanto, tem tantas semelhanças com o filme quanto o budismo. O principal ponto
em comum é a idéia de samsara ou maya, segundo a qual as nossas vidas são uma
grande ilusão montada pelos nossos próprios desejos. É como se todo o mundo
fosse, como diz Morpheus, uma projeção mental da sua personalidade. As
pessoas estariam presas em um ciclo: elas tratam o que sentem como se fosse
real e a ignorância de que aquilo é só uma ilusão as mantém presas a esse
mundo. Em uma das cenas do filme, Neo encontra uma criança com trajes de monge
budista que entorta uma colher com a mente. O segredo, diz ela, é saber que a
colher não existe. Uma vez superada a ilusão, atinge-se o nirvana, um estado
que as palavras não podem descrever, em que a noção de indivíduo se perde.
Um dos maiores reforços
desse ciclo de ignorância é o fato de estarmos cercados de pessoas que também
tratam as ilusões como se fossem reais. Essa idéia foi bem retratada no filme
como uma rede de computadores que liga as percepções dos indivíduos, permitindo
que um reforce no outro a ilusão de um mundo que não existe, diz a
historiadora Rachel Wagner, da Universidade de Iowa, que, assim como Frances, é
autora de um texto comparando o filme às religiões.
O caminho para a
transcendência é a busca pessoal pela iluminação, tanto para os budistas quanto
para Morpheus, que afirma que ninguém pode explicar o que é a Matrix. Você
precisa ver por você mesmo. Já Buda disse a seus seguidores: Vocês próprios
devem fazer o esforço; os que despertaram são apenas professores, e a mesma
explicação poderia vir de Morpheus: Estou tentando libertar sua mente, Neo.
Mas eu só posso lhe mostrar a porta. Você é quem tem que atravessá-la. Pegou o
espírito da coisa?
As coincidências são
muitas, mas a essa altura você pode estar se perguntando se afinal os autores
do filme realmente pensaram nisso tudo. Em uma de suas poucas declarações, os
irmãos Wachowski disseram ser fascinados pelo budismo e querer colocar elementos
da doutrina no filme. Boa parte das referências ao cristianismo também deve ser
proposital devido ao grande número de termos bíblicos que aparece na obra. Eles
talvez só não tenham tido a intenção de fazer uma alusão direta ao cristianismo
gnóstico. Para os pesquisadores, isso é até mais interessante. Não há certeza
sobre a origem do gnosticismo. Algumas pessoas sugerem que ele surgiu da interação
entre o judaísmo e religiões como budismo e hinduísmo. Se os autores do filme
misturaram conceitos judaico-cristãos com temas orientais e o gnosticismo
surgiu como um resultado não-previsto, isso é muito intrigante, afirma
Frances. Para aumentar a coincidência, o nome de Neo na vida real é Thomas, que
também é o autor do principal evangelho gnóstico.
A discordância entre o
filme e todas essas religiões é que, em Matrix, a salvação envolve muito
quebra-pau. Enquanto as crenças pregam a paz e a não-violência, a exigência de
Neo para salvar Morpheus são armas, muitas armas. A pancadaria não vai mudar
nas continuações. O clímax de Reloaded é uma longa perseguição em uma rodovia
que deverá inspirar a maioria das cenas de ação dos próximos anos. Nada menos
do que lutas de kung-fu no teto de um caminhão em movimento, corridas de moto
na contramão, agentes pulando de um automóvel para outro e batidas suficientes
para lotar dezenas de ferros-velhos. A cena foi a primeira a ser filmada. Para
fazê-la, era preciso achar uma estrada que pudesse ser ocupada durante mais de
dois meses e que, ainda por cima, tivesse um certo aspecto apocalíptico.
Compreensivelmente, os diretores não encontraram um lugar adequado. A solução
foi desembolsar 2,4 milhões de dólares para construir uma rodovia de 3,2
quilômetros com todos os detalhes em uma base naval na Califórnia, Estados
Unidos. Bancar uma brincadeira dessas só foi possível devido aos mais de 300
milhões que eles tinham para fazer os dois filmes, uma quantia enorme até para
os padrões de Hollywood.
Não são só as religiões
que aparecem retratadas no filme. Quem passear pelos fóruns de fãs na internet
verá pessoas comparando-o às mais diversas (e às vezes contraditórias)
correntes da filosofia, psicologia e sociologia. É uma evidência de que o
filme funciona como um mito moderno assim como as grandes histórias do
passado, ele pode ser interpretado de muitas formas, diz Christopher Grau.
Algumas pessoas forçam um pouco a barra nas análises, mas existem algumas
teorias que se encaixam tão bem ao filme que, se o autor estivesse vivo,
poderia quase processar os diretores por plágio.
O principal deles é o
filósofo grego Platão. Um diálogo escrito por ele há quase 2 400 anos narra o
mito da caverna, uma história semelhante à de Matrix em uma versão,
evidentemente, muito mais low-tech. Imagine uma prisão subterrânea em que as
pessoas ficam amarradas ao mesmo lugar desde a infância e onde tudo o que
conseguem ver são sombras das pessoas e objetos que estão fora. O cárcere é tão
eficiente que eles nem percebem que estão presos e pensam que o mundo é mesmo
aquele monte de sombras. Caso saíssem, estariam praticamente indefesos as
pernas não funcionariam, os olhos não conseguiriam enxergar e até a mente se
recusaria a aceitar o novo mundo. Seria tão chocante que muitos prefeririam
voltar para a caverna e esquecer tudo aquilo. Alguns, no entanto, conseguiriam
se adaptar, perceber o horror da situação inicial e ter um conhecimento
superior e mais verdadeiro sobre o mundo.
Nós humanos seríamos
iguais a esses prisioneiros, amarrados a um mundo de aparências que não refletem
a verdadeira realidade. A saída, segundo Platão, está na filosofia, na educação
e na iluminação. Elas são o caminho para o mundo das formas ou das idéias (os
gregos usavam a mesma palavra para as duas coisas), o lugar onde está a
essência das coisas, a realidade verdadeira. Soou familiar? Os conselhos de
Morpheus também valem para Platão: para chegar lá é preciso um doloroso
processo de autoconhecimento que, uma vez conseguido, torna a pessoa sábia,
justa e capaz de discernir a realidade da ilusão com a mesma facilidade com que
Neo se desvia das balas. Com essa linha de pensamento, Platão se tornou um dos
pais da ciência moderna. O filme lida com temas comuns a quase toda a história
da filosofia.
Ele não especifica uma
teoria ou uma concepção filosófica, apenas brinca com a diferença entre o
inteligível e o que a gente vê, afirma o filósofo Verlaine Freitas, da
Universidade Federal de Ouro Preto, que pesquisou as implicações teóricas do
filme.
Assim como Morpheus
pergunta a Neo se ele já teve um sonho tão real a ponto de se questionar se era
sonho ou realidade, René Descartes, pensador francês do século 18, escreveu: Quando
penso sobre meus sonhos claramente, vejo que nunca existem sinais certos pelos
quais estar acordado pode se distinguir de estar dormindo. O resultado é que
fico tonto e esse sentimento só reforça a idéia de que eu posso estar sonhando.
Ele imaginou a possibilidade de um terrível demônio estar constantemente lhe
dando a ilusão de que todas as suas certezas são corretas, quando na verdade
elas não fariam qualquer sentido. Mesmo em coisas simples como calcular 2 mais
2, o demônio forneceria sempre os mesmos resultados errados, o que daria a
impressão de que eles estão sempre certos. Descartes conclui que, como não
podemos provar se esse demônio existe ou não, nenhuma de suas opiniões era
segura.
Ele e diversos
filósofos que vieram depois propuseram saídas para essa cilada filosófica, mas
as soluções estão longe de serem aceitas por todos. A questão de se esse
demônio existe ou não continua de pé até hoje e é quase igual a outra questão:
como garantir que não vivemos na Matrix? Por enquanto, a resposta é,
simplesmente, que não há resposta.
Para fundir ainda mais
a cabeça dos fãs, os produtores de Matrix estão se esforçando para dificultar a
distinção entre sonho e realidade. Os efeitos especiais do filme receberam um
belo upgrade: uma técnica chamada cinematografia virtual, capaz de fazer o
truque de tempo de bala parecer um vídeo de festa infantil. A invenção
simplesmente elimina a diferença entre o que foi filmado no mundo real e o que
é obra do computador. O modo convencional de simular objetos com computação
gráfica é montá-los de dentro para fora: primeiro fazer o esqueleto, depois
cobri-lo com texturas e daí aplicar a iluminação. Essas imagens, vistas por
seres humanos como nós, capazes de fazer e reconhecer mais de 10 mil expressões
faciais, parecem no máximo um videogame melhorado. A equipe de Reloaded e
Revolutions usou uma abordagem diferente, de fora para dentro. Ela filmou os atores
utilizando, ao mesmo tempo, cinco câmeras de definição gigantesca, capazes de
captar até os poros e defeitos da pele.
Depois jogou todo esse
material em um software que acompanhou os movimentos de cada irregularidade do
rosto e montou a cena, em três dimensões, no computador. Os diretores puderam
então filmar do ângulo e com o movimento que quisessem. O resultado é
impressionante: em uma cena de Reloaded, Neo luta contra 100 cópias de seu
maior adversário, o agente Smith, todas geradas por computador, enquanto o
enquadramento faz movimentos em arco que destruiriam qualquer câmera de
verdade.
As próprias tecnologias
usadas para fazer o filme, com uma estranha ironia, podem dar origem aos
primeiros protótipos do que seria a Matrix. Um exemplo é o plano da agência de
pesquisa militar do governo americano, a Darpa, que pretende utilizar os mesmos
efeitos especiais para criar simulações de campos de batalha mais envolventes.
Outras tecnologias que aparecem no filme computadores inteligentes e a
capacidade de carregar informações diretamente ao cérebro podem ser feitas em
algumas décadas, ao menos segundo os pesquisadores mais otimistas. Esses avanços
são viáveis e têm uma boa possibilidade de se tornarem reais ainda durante o
nosso tempo de vida, afirma Ray Kurzweil, um dos mais renomados estudiosos de
inteligência artificial. Para ele, o motivo é que as tecnologias de diversas áreas
têm evoluído em uma escala exponencial, ou seja, elas não só estão se tornando
mais rápidas e sofisticadas como a velocidade com que evoluem também está
aumentando.
Haverá um ponto em que
se tornarão tão avançadas que conseguiremos analisar o cérebro humano em seus
mínimos detalhes e reconstruí-lo artificialmente. Isso nos permitirá fazer
máquinas com algumas características humanas e até misturar neurônios a
circuitos eletrônicos para que os dois possam trocar informações.
Existem outros
cientistas um tanto mais céticos a esse respeito. Há muita dúvida sobre se é
possível reproduzir artificialmente o que o ser humano tem de mais
desenvolvido, traços como a consciência, as emoções e o humor. Certamente um cérebro
feito com tecidos biológicos pode ser consciente somos um exemplo dessa
possibilidade. Se utilizarmos outros materiais teremos propriedades diferentes,
mas é pouco provável que seja algo que reconheceremos como uma consciência
humana, afirma o psicobiólogo Victor S. Johnston, da Universidade do Novo
México, nos Estados Unidos. Essa é outra questão que está longe de ser
respondida, mas o interessante é que, para Johnston e muitos outros
psicobiólogos, a nossa consciência é uma espécie de realidade virtual. Ela
evoluiu para impor uma interpretação específica das energias e matérias que
estão à nossa volta, diz Johnston. Nada no Universo é, por exemplo, vermelho
ou verde em si mesmo.
O que existem são ondas
eletromagnéticas de determinadas freqüências que são captadas pelos nossos
olhos e interpretadas de modo a facilitar a identificação. Assim, objetos que
emitem determinadas ondas são chamados de vermelhos e outros, com ondas quase
nada menores, são chamados de verdes, apenas para facilitar a identificação. Ao
longo do tempo, a evolução permitiu adaptarmos nossas emoções ao que é benéfico
para nós. Assim, as substâncias emitidas por comidas podres são fedorentas e
com isso as evitamos mesmo sem conhecer as bactérias que as contaminam. Da
mesma forma, a perda de um companheiro é triste, o açúcar (que fornece energia)
é gostoso e o sexo (que perpetua a espécie) é prazeroso. Não existem cores,
cheiros, gostos ou emoções sem um cérebro consciente. O mundo da nossa consciência
é uma grande ilusão, afirma Johnston.
Construir uma
consciência artificial teria implicações muito maiores do que uma série de
agentes Smith circulando por aí. Talvez isso seja a própria prova de que a
nossa realidade seja de fato uma simulação por computador. Quem garante é o
filósofo Nick Bostrom, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, que trabalhou
com a possibilidade de um dia criarmos programas de computador que tenham
consciência. Em um artigo publicado no mês passado na revista britânica
Philosophical Quarterly, ele calcula que existam apenas três possibilidades
para o futuro da humanidade. A primeira é que nós seremos extintos antes de
construir esses programas, por azar ou porque eles são simplesmente impossíveis
de serem feitos. A segunda é que, mesmo que nós possamos fazê-los, não haverá
interesse da humanidade em inventá-los, talvez por problemas éticos. A
terceira, mais perturbadora, é que nós um dia inventaremos essas consciências
simuladas e universos virtuais inteiros para que elas tenham onde viver.
Nesses casos, as
chances de alguém ter feito isso antes são muito grandes, e nós talvez fôssemos
uma dessas simulações. Seríamos como na Matrix, com a única diferença de não
termos um corpo em outra realidade. O cérebro também seria simulado, diz
Bostrom. Tudo bem, sempre resta a esperança de que nós fôssemos o grupo que
criou todas as consciências virtuais, o que ele chama de história original,
mas isso seria muito improvável. Para Bostrom, existiriam tantas simulações que
precisaríamos de muita sorte para estarmos justamente no único Universo que é
real. As platéias para quem eu apresentei essa teoria ficaram intrigadas, mas
por enquanto ninguém achou uma falha no meu argumento, diz Bostrom. A questão
agora é descobrir qual das três propostas é a mais provável o palpite dele é
que seja a segunda, e que as chances de que habitemos um mundo virtual estejam
em torno de 25%.
Mesmo que o nosso mundo
seja apenas uma realidade simulada, é possível que nossa vida não mude tanto.
Afinal, já somos bombardeados tanto por notícias de lugares distantes, detalhes
da vida de celebridades, programas de televisão, anúncios, filmes e tantas
fotos e imagens que os nossos próprios assuntos ocupam um pedaço cada vez menor
do nosso tempo. Essa é uma das teorias do único filósofo citado em Matrix, o
francês Jean Baudrillard, autor do livro Simulacros e Simulação, onde Neo
esconde os disquetes no início do filme. O curioso é que Baudrillard estaria
mais para Cypher o rebelde que trai o grupo para voltar para a ilusão da Matrix
do que para Morpheus. Baudrillard prefere trabalhar com a ironia e com os
paradoxos a procurar um mundo mais verdadeiro, diz Juremir Machado da Silva,
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, tradutor de muitas
das obras do autor.
O próprio universo de
Matrix, com suas cenas, efeitos e histórias envolventes, é capaz de nos
transportar para um outro mundo que não vivemos e fazer com que nós fiquemos
alegres, ansiosos e emocionados com acontecimentos que não fazem parte da nossa
vida. Se os autores quiserem continuar nessa linha, é possível que, depois de
tantas lutas e reviravoltas, Morpheus, Neo e os demais rebeldes percebam que a
realidade que tanto lutaram para libertar não é muito mais real do que a que
viviam na Matrix.
Os mundos paralelos parecem ser escalas de desenvolvimento de almas. Ou elas alcançam o estagio superior ou morrem. A
Física representa uma verdadeira revolução para a evolução e para o
conhecimento deste século, e por desvendar mistérios da nossa realidade simples,
tem atraído muitos curiosos para a ciência. Porém, quando o estudante tem
contato com o reconhecimento da existência do mundo quântico, algo totalmente
novo e desconhecido acontece e, assim percebe que a abrangência das
possibilidades pode contrariar tudo o que se sabia até então.
As informações deixadas nos livros
sagrados, dos antepassados, trouxe um entendimento satisfatório a respeito das
menores estruturas conhecidas na natureza, dos mundos paralelos e das dimensões.
A teoria da relatividade proporcionou um norte para ciência,
por ser um salto para conceber o funcionamento das maiores estruturas do
cosmos.
A hipótese do universo holográfico pode ser o elo entre
mecânica quântica e relatividade geral, e apesar de funcionarem muito bem para
explicar seus objetos de estudo, as teorias apresentam diversos conflitos entre
si. Um dos maiores desafios da atualidade vem sendo o desenvolvimento de uma
teoria unificada que dê conta de tudo no universo. Em outras palavras, busca-se
o elo perdido entre a mecânica quântica e a relatividade geral. Descobrir os
preceitos que preencham esta lacuna significaria fornecer ao ser humano a
compreensão total das coisas do universo. Dois artigos recentes comprovaram
matematicamente uma hipótese que permite casar as teorias do micro e do macro:
de que o nosso cosmos é um holograma de um cosmos mais simples, onde não há
gravidade.
Apesar de soar estranha, a ideia
fornece uma ferramenta poderosa para os físicos teóricos, pois com ela podem
testar harmonicamente teorias nos dois campos da física. Em linhas gerais, o
estudo computou numericamente diversas propriedades dos buracos negros (como a
energia interna e a entropia). Ao calcular a energia interna de um universo sem
gravidade de uma dimensão mais baixa, eles chegaram no mesmo resultado.
De quebra, o conceito do
universo-holograma ainda fornece as bases para que a teoria das cordas se
sustente. Promissora mas não comprovada por falta de recursos experimentais,
quando encarada sob este prisma, a teoria é perfeitamente plausível. O motivo é
o fato de as complexas e intrincadas cordas que comporiam nosso universo,
existentes em nove dimensões espaciais e uma temporal, seriam um holograma, uma
mera projeção das ações que ocorrem neste universo mais simples e mais plano,
de apenas uma dimensão.
Joel Fraga
jornalista
via
Nature
Revista Superinteressante
Revista Superinteressante
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